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Foto do escritorFernando Luzio

Complexidade Predatória


Foto: Akinshin | Dreamstime.com

Pesquisa da Luzio Strategy com mais de 300 executivos(as) de dez empresas diferentes, em 2017, apontou que, em média, 55% do tempo dos gestores era consumido em atividades consideradas por eles(as) como burocráticas - e honestamente acredito que a estatística é válida ainda nos dias de hoje para inúmeras empresas. Mesmo nas áreas comerciais, nas quais supostamente deveriam passar a maior parte da semana no campo visitando clientes e desenvolvendo negócios, eles permanecem no escritório, assoberbados por atividades internas na periferia de sua missão central. Essa realidade é consequência de diversos fatores, claramente identificados em nossos estudos, e 7 (sete) deles merecem especial atenção dos empresários e executivos: 1) A dificuldade de dizer "não" para as oportunidades que aparecem no radar aumenta sobremaneira o número de produtos ou serviços no portfólio. Oferecer variedade para o cliente é uma evolução natural da proposta de valor das empresas. Mas a expansão do portfólio gera uma complexidade crescente nos processos e na estrutura organizacional, acentuada pela falta de uma avaliação periódica que resulte na retirada ou terceirização de alguns dos produtos que se comprovaram pouco relevantes. Por outro lado, viciamos os consumidores e clientes com novidades permanentes, o que aumenta o temor de fazer não escolhas que a concorrência, por sua vez, poderia transformá-las em plataformas de negócios rentáveis e fontes adicionais de singularidade, levando lideranças a preferirem abraçar um número exagerado de oportunidades. A falta de critérios claros de classificação dessas alternativas, que dão respaldo e coragem para fazer renúncias, também gera equívocos na seleção do mix mais importante para a empresa. 2) A dificuldade de priorizar iniciativas cria uma proliferação de projetos em paralelo que envolvem gestores em inúmeras reuniões sobre temas variados. Não é incomum as empresas definirem mais de 30 projetos em ciclos de planejamento estratégico, a maioria deles envolvendo diversas áreas na fase de formulação e iniciados ao mesmo tempo. Em razão disso, ouvimos todos os dias gerentes e suas equipes reclamando que não aguentam mais serem convocados para tantas reuniões e que precisam de mais tempo de qualidade para fazer as atividades centrais de suas funções. Dividir a carteira de iniciativas em ciclos de execução é uma medida simples que alivia o peso do cronograma geral, libera mais tempo de qualidade para as atividades-chave dos gestores e concentra a atenção de todos em realizar poucas coisas muito bem feitas em cada ciclo.

A sessão de músicas da iTunes Store, loja virtual da Apple, tem mais de 20 milhões de títulos disponíveis... A proliferação da variedade de alternativas ao alcance do consumidor e a disciplina empresarial da oferta constante de novidades é uma fonte inexorável de complexidade para as organizações e seus gestores.

3) Seduzidos por modismos dos mais variados, executivos acabam disparando diversas frentes simultâneas de capacitação organizacional – desde novos métodos de gerenciamento de projetos até novas práticas de gestão. E para piorar, a vaidade é inflamada pelo encanto das soluções mais sofisticadas e empregadas por empresas de sucesso, as quais aparentam ser mais significativas e marcantes para o legado do líder. Muitas vezes são métodos que tentam reinventar a roda e acabam roubando ainda mais tempo das equipes. Outro engano muito comum: gestores(as) que apresentam gaps de capacitação muito claros e específicos, e que poderiam ser cobertos por ações mais cirúrgicas de desenvolvimento, preferem pleitear o patrocínio da empresa para um programa de MBA. Conversando com um jovem e recém empossado Gerente de Marketing, por exemplo, ficou claro que ele apresentava perfil e atitudes absolutamente aderentes ao cargo. No entanto, não sabia como fazer networking para expandir sua rede de contatos e gerar leads mais atrativos. Em vez de pleitear um programa de Coaching ou um treinamento específico sobre o tema, conquistou o investimento da empresa num MBA. Obviamente, não encontrou no curso o desenvolvimento das habilidades mais necessárias a suas atividades. 4) A intensificação das ações de Compliance e gestão de riscos para reforçar a segurança empresarial tem aumentado o número de alçadas e atividades de controle que permeiam os processos. Os escândalos de fraudes empresariais e o avanço do crime organizado, não somente no Brasil, aumentam ainda mais a necessidade de sofisticar o controle. Encontrar um modelo seguro, que não aumente a complexidade organizacional a ponto de engessar a empresa, é um grande desafio para os próximos anos.

Apesar do avanço progressivo da transformação digital, o aumento da complexidade é gritante nas empresas contemporâneas.

5) A dança de cadeiras de executivos(as), cada um incorporando suas práticas de gestão que imprimem seu legado nas empresas por onde passam, aumenta a ramificação nem sempre adequada de atividades para os requisitos dos processos. O resultado é uma colcha de retalhos de atividades difíceis de conectar e otimizar, aumentando a burocracia organizacional. Essa tendência é agravada pela entrada de novos gestores que demoram a assimilar o DNA da cultura organizacional e gastam tempo propondo modelos com nenhuma aderência à empresa. Outro dia, assisti à apresentação de um diretor de Governança e Estratégia que acabara de assumir o cargo em uma empresa que tem como um de seus Valores absolutamente genuínos a Simplicidade. No final da palestra, eu o aconselhei, em particular, a ser menos ambicioso no arcabouço metodológico, pois era sofisticado demais para aquela empresa. Ele deve ter me achado atrevido pela tamanha exuberância técnica do seu discurso. Dito e feito: 8 (oito) meses depois, o empreendedor o demitiu pela dissonância de suas práticas com a cultura organizacional. 6) A implementação de sistemas nem sempre atinge o objetivo essencial de automação e de simplificação esperadas pelos gestores, por diversas causas: Em primeiro lugar, a falta de conexão direta dos aplicativos com os processos acaba gerando controles paralelos em planilhas, cada uma com toda a sorte de riscos de erros na entrada de dados para cálculo de indicadores. Em segundo lugar, o excesso de customizações requeridas pelos usuários estica o período de implantação do sistema e torna ainda mais demorada a percepção dos benefícios da tecnologia. Por fim, a impressionante falta (ou falha) de treinamento dos usuários, os quais desconhecem e demoram a descobrir as funcionalidades essenciais que já se encontram na tecnologia e são suficientes para apoiar a tomada de decisão. 7) As reuniões, em geral, são pouco produtivas e muito demoradas. As causas são inúmeras: falta de objetividade e método para favorecer a eficiência dos encontros; falta de pontualidade e ausência de participantes relevantes, os quais obrigam a remarcação ou agendamento de uma reunião complementar para chegarem à decisão final; falta de tempo (ou organização) dos gestores para uma preparação prévia mínima, que poderia melhorar a produtividade das reuniões, levando insegurança para reuniões supostamente agendadas para um desfecho definitivo; e, talvez o mais importante, falta de método para alinhar e clarear o escopo das iniciativas estratégicas, gerando retrabalhos dos mais variados. O aumento da complexidade das organizações é resultado natural e inexorável de seus movimentos expansionistas e de crescimento. Uma complexidade cada dia mais predatória porque afasta as pessoas daquilo que mais importa. Por isso, as empresas precisam constantemente rever a Estratégia, o Portfólio de Modelos de Negócios e Produtos, os Processos, os Sistemas e as Políticas Corporativas em busca de simplificação, otimização e efetivas renúncias que são necessárias para preservar o foco nas atividades de alto impacto ao negócio. Como dizia Picasso, "a arte é a eliminação do desnecessário".

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